Entre Olhares: ÚTEIS x INÚTEIS

Os embates políticos e ideológicos ocorridos durante este mês de maio em nosso país mostraram na prática o quanto as CIÊNCIAS SOCIAIS, tão ferozmente rebatidas pelas autoridades educacionais do Governo, são essenciais para o entendimento da realidade que nos circunda. Até então, era visivelmente notória a aversão governista contra a formação política e cidadã do Povo, chegando a afirmar de forma contundente que “essa garotada não deve se interessar por política”.

Entretanto, não só se interessam, como deram um retumbante exemplo prático de politização, ao engrossarem as fileiras nas ruas de mais de 250 cidades espalhadas por diversas partes do país, dizendo “não aos cortes orçamentários na Educação!”. Indignado com a expressiva força democrática dos estudantes brasileiros, Sua Excelência, o Presidente da República, lançou mão da mais velha e carcomida estratégia ultradireitista, que é buscar a desqualificação de seus inter locutores.

“IDIOTAS ÚTEIS!” bradou e esbravejou sua excelência. Ao que tudo indica, o maior mandatário de nossa sociedade, que sempre volta atrás em suas afirmativas e bravatas, mais uma vez entrou em contradição. Ao esbravejar contra a manifestação estudantil (não só, mas em especial), sua excelência deu sinais de que ouviu (não sabe onde e nem quando) alguma coisa relativa aos ensinamentos gramscinianos acerca da existência da intelectualidade social.

Antonio Gramsci nasceu em Ales, Sardenha, Itália, 1891 – 1937. Jornalista, crítico literário, político e cofundador do Partido Comunista italiano. Preso pelo Fascismo durante 10 anos, escreveu CADERNOS DO CÁRCERE, sua obra-prima, que transformou a visão economicista do Materialismo Dialético de Karl Marx. Enumerou diversas categorias de intelectuais: urbanos, industriais, rurais, burocráticos, acadêmicos, tradicionais, dentre vários outros (SEMERARO, 2006).

De acordo com Semeraro (2006) Gramsci apresenta os intelectuais intimamente entrelaçados nas relações sociais, pertencentes a uma classe, a um grupo social e vinculado a um determinado modo de produção. Gramsci valoriza o saber popular, defende a socialização do conhecimento e recria a função dos intelectuais conectando-os às lutas políticas dos subalternos. Sugere que os intelectuais políticos façam uso da empatia, fazendo parte do mundo e do movimento real, ao que Karl Marx (1845) chamava de Filosofia da Praxis.

Monteiro & Almeida Júnior (2017) afirmam que Gramsci descrevia o Intelectual Tradicional como historicamente formado por grupos da Classe Dominante, mediador de informações, não necessariamente letrado, mas representante da vontade deste grupo, preso a uma formação socioeconômica superada, determinado a manter o atrelamento a um status quo antiquado. Ao aproximar a teoria à prática, este intelectual torna transparente o jogo de poder e as relações antagônicas de classe.

O suposto desinteresse dos mediadores da informação (os intelectuais) pelas classes populares gera profissionais improdutivos, passivos, guardiões do passado, ociosos, INÚTEIS e sem função social por reproduzir a ideologia dominante e colaborar na sustentação e preservação das ideias e interesses das classes que detêm o Poder. Não só o desinteresse, mas também a elitização da Educação Brasileira acabou por afastar nossos intelectuais das grandes massas populares, que passaram a discursar entre si, num linguajar inacessível, dentro dos círculos fechados das Revistas, Congressos e Encontros científicos.

A retomada das ruas pelos estudantes e a vociferação de sua excelência me fez retomar os ensinamentos de Gramsci. Nossos intelectuais que estavam se tornando inúteis às massas populares, voltam às ruas com seus alunos, levando suas aulas, suas retóricas, fazendo “balbúrdia” e mostrando a relevância das Ciências Sociais para o entendimento do momento político de nosso país. Sua excelência, como de costume, retrocedeu aos seus esbravejamentos. Contudo, prestou uma inestimável contribuição aos MOVIMENTOS SOCIAIS E POLÍTICOS, que ao bom ensinamento de Gramsci, estão reinventando suas estratégias de luta, levando para fora dos muros escolares e acadêmicos a sua produção científica que inestimáveis colaborações prestam às lutas das massas trabalhadoras que tanto contribuem para a manutenção do seu pensar.

*Por Lucio José de Oliveira